POR FABIANA ABREU PRADO DE ALENCAR

Terapeuta Ocupacional pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Especialista
em Terapia Ocupacional Dinâmica pelo CETO-SP. Especialista em síndrome de
Down (T21) pelo CEPEC-SP e Unaes. Terapeuta Ocupacional clínica no CEPEC-SP

Este capítulo tem o objetivo de relatar aspectos da intervenção da terapia ocupacional que podem contribuir para o desenvolvimento de pessoas com síndrome de Down (T21).
Essa contribuição visa a favorecer, desde os anos iniciais até a vida adulta, a experiência de uma vida plena e participativa. A terapia ocupacional é uma profissão que integra a equipe multiprofissional de estimulação precoce. Dessa forma, trabalha para intensificar condições facilitadoras do desenvolvimento motor e cognitivo de lactentes e de crianças, compondo uma variedade de estímulos que, segundo Trevisan C. Apud Xavier J., compõem um programa de acompanhamento para recém-nascidos de risco ou que apresentam algum tipo de deficiência. Esse percurso de acompanhamento e tratamento precoce integra um trabalho de longo prazo que visa promover oportunidades de aprendizagem e apresentar respostas distintas que respeitem a singularidade de cada criança, da maneira como ela vai se apresentando no processo do desenvolvimento infantil.


Sendo assim, a terapia ocupacional pode oferecer uma valiosa contribuição para ampliar as condições do repertório no cotidiano da criança com síndrome de Down (T21), ao trabalhar com o foco no campo
das vivências e informações sensoriais da criança, com especial atenção para a singularidade que caracteriza as relações da criança com o mundo ao seu redor. Em um tratamento de longo prazo, que busca
facilitar e ampliar também o repertório de sociabilidade da criança, é de particular importância considerar algumas características que podem acompanhar a síndrome de Down (T21), tais como a presença de
cardiopatias e hipotonia com possível baixa iniciativa, que vão marcar a capacidade infantil de explorar e investir no ambiente, influenciando diretamente seu desenvolvimento cognitivo, motor e social. Essa
perspectiva norteia o trabalho da terapia ocupacional na busca de criar condições para superar as eventuais dificuldades que se apresentam à medida em que as atividades e os fazeres vão se tornando
mais complexos ao longo do desenvolvimento da criança em sua relação com a vida cotidiana.


Sabe-se que a exploração ambiental dos anos iniciais da infância será determinante para a condição de participação ativa no mundo e se refletirá ao longo das diversas etapas da vida, em diferentes situações de aprendizagem. Uma vez que a complexidade do mundo vai estabelecendo desafios que vão se tornando gradativamente mais elaborados e exigentes, “(…) os terapeutas ocupacionais consideram
que as habilidades do indivíduo para atividades básicas se desenvolvem e mudam ao longo da vida, portanto buscam promover a sua própria independência e autonomia para realizá-las.” (Castanharo R.,
Wollf L., 2014).


Tendo em consideração a complexidade do mundo em que a criança está inserida, a terapia ocupacional, quando iniciada logo ao nascimento, permitirá tanto uma orientação precisa aos pais, quanto uma intervenção terapêutica. Ela favorecerá as habilidades que potencializam a capacidade exploratória da criança, estimulando o seu desenvolvimento global, que será implementado a partir de práticas e de orientações, visando as habilidades atencionais e motoras; a interação com o ambiente; e a estimulação da iniciativa, habilidade essa que tende a comprometer diretamente as habilidades motoras da
criança.


Embora nem sempre se perceba, é importante ressaltar que o desenvolvimento das habilidades motoras finas, que serão centrais no desempenho de diversas atividades da vida cotidiana, se dá desde o nascimento e é potencializado pelo desenvolvimento motor global da criança. Há muito existe um consenso quanto à importância de ações e de orientações voltadas à facilitação dos processos desenvolvimentais, considerando-se que, no campo da terapia ocupacional, esta “(…) prepara e habilita a criança por meio de estímulos sensório-motores, perceptivos, espaciais e temporais, como base para
a aquisição de Atividades de Vida Diária e Atividades de Vida Prática.” (Cohen, M., Kudo A. et al, 1994).

 

A condição de ser-no-mundo da criança está intimamente vinculada às possibilidades exploratórias que lhe são oferecidas desde cedo. Veja-se, por exemplo, a aquisição da marcha, que é um marco muito importante para a vida infantil e que é facilitado pelo trabalho da terapia ocupacional, uma vez que esta implica na criação de condições de autonomia e de autodeterminação, a fim de que a criança possa se locomover e ir ao encontro daquilo que lhe interessa, de forma a ampliar a exploração do ambiente e, consequentemente, seu repertório cognitivo. Assim, evidencia-se o compromisso da terapia ocupacional em “(…) oferecer condições e em apoiar a criança para que ela possa explorar os objetos, compreender sua função e exercitar suas habilidades atencionais, mostrando a ela que existem formas e funções diversas na exploração ambiental as quais terão consequências no seu desenvolvimento” (Alencar, 2017). Tanto a exploração ativa e espontânea, quanto a exploração direcionada e concentrada dos objetos, pode enriquecer o repertório infantil, trazendo novas possibilidades de criação e de composição relacional no campo interpessoal e social que compõem o cotidiano infantil.
Apenas para ilustrar o que foi dito acima, a partir do segundo ano de vida a família é orientada a brincar diariamente com a criança sentada em uma cadeira com prancha, por um curto período de tempo, para que a mesma se mantenha em uma atividade direcionada. Um jogo, um livro curto que exponha a criança às diferentes texturas ou uma atividade de jogo simbólico/função dos objetos, propiciará um
vivência de exploração atenta e direcionada, favorecendo habilidades cognitivas e sociais que serão aplicadas em momentos importantes e decisivos, como o futuro ingresso na vida escolar.

 

O acompanhamento de terapia ocupacional permite, em cada fase desse processo de desenvolvimento, tanto um apoio à família, de forma a instrumentalizá-la para a estimulação diária da criança, quanto um trabalho ampliado que, além do foco nas habilidades cognitivas e atencionais, está atento às habilidades motoras, visto que “(…a avaliação motora identifica alterações no desempenho motor, possibilitando a oferta de suporte adequado para as crianças e suas famílias a fim de reduzir o impacto de dificuldades motoras nas atividades diárias e na vida escolar.” (Silva, C.G. et al, 2017).
As crianças aprendem de forma mais efetiva através de experiências vividas e isso não é diferente em crianças com síndrome de Down (T21). Esse processo se inicia desde o nascimento e, por isso há o encorajamento para que as crianças vivam o máximo possível de experiências dentro e fora de casa, em parques, praias, etc., experimentando e explorando também os elementos sensoriais do ambiente.
Nesse ponto, é importante ressaltar a relevância da alimentação como um momento de convívio diário e também de exploração de novas habilidades, bem como das propriedades variadas dos alimentos
de sua dieta. Por exemplo, sentir a textura da casca das frutas, sentir o cheiro, experimentar o gosto da fruta, explorar sua forma inteira, pegar os pequenos pedaços, criando a oportunidade de participar ativamente de todos os aspectos de sua rotina. Isso é particularmente importante quando se trata de bebês, pois um bebê ativo e curioso será uma criança exploradora que não se fechará frente a novos desafios e se sentirá encorajado e potente frente aos desafios da aprendizagem ao longo da vida.

Veja mais acessando a Parte 2 desse artigo.

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