POR ADRIANA LEISTER

Terapeuta Ocupacional pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais, Consultora em Inclusão e Desenvolvimento Infantil com Capacitação em Integração Sensorial pela Universidade Federal de Minas Gerais e Certificação Internacional pela University Of Southern Califórnia

‘’Para as crianças tudo é espantoso: um ovo, uma minhoca, uma concha
de caramujo, o vôo dos urubus, os pulos dos gafanhotos, uma pipa no céu,
um pião na terra. Coisas que os eruditos não vêem.’’
Rubem Alves

Rubem Alves nos lembra que para o bebê o mundo é uma grande surpresa. Sabemos que a mão de um bebê recém-nascido não manipula um brinquedo, ele ainda não tem equilíbrio, não senta, engatinha, anda, fala e não sabe distinguir o que vê, a textura ou a consistência de objetos. Tudo deverá ser aprendido fazendo uso dos seus sentidos: visão, audição, tato, olfato, paladar, propriocepção e sistema vestibular. Jean Ayres, PhD, terapeuta ocupacional norte-americana se dedicou a pesquisar como toda a informação que recebemos através destes sentidos se integram no sistema nervoso central e como este processo afeta o desenvolvimento e o comportamento.

Segundo Ayres (1974), que começou a usar o termo Integração Sensorial nas abordagens terapêuticas, a maior parte da atividade de uma criança nos seus primeiros sete anos de vida se traduz num processo: o processo de organizar as sensações que recebe do ambiente e do próprio corpo no sistema nervoso. Para ela, a Integração Sensorial fornece a base para a aprendizagem e a regulação emocional, apoiando a participação da criança nas ocupações da infância como o brincar, o desenvolvimento da autonomia nas rotinas de autocuidado e nas atividades escolares. Contribui também para o desenvolvimento da coordenação motora fina e grossa, para a capacidade de autorregulação e organização do comportamento. Especificamente, a autorregulação está associada a “habilidade de atender a um pedido, iniciar e cessar atividades conforme a demanda situacional, modular a intensidade, frequência e duração de ações motoras e verbais em ambientes de educação social, postergar ações sobre um objeto desejado ou um objetivo e gerar comportamentos socialmente aceitos na ausência de monitores externos” (Kopp, 1982, p. 199-200).


Todas as informações sensoriais são importantes para o surgimento de respostas adaptativas e para estarmos em sincronia com o que acontece ao nosso redor, porém, a teoria de Integração Sensorial dá ênfase aos sistemas tátil, vestibular e proprioceptivo que amadurecem mais precocemente, transmitem informações sobre o corpo e suas fronteiras e influenciam as interpretações visuais e auditivas.


A visão, por exemplo, não pode ser entendida apenas como sinônimo de resposta à luz, ver é mais do que olhar. Os olhos são órgãos sensoriais exteroceptivos, que fazem parte de um organismo maior e mais complexo. Nos anos iniciais, a criança toca tudo que vê numa tentativa de apreender a totalidade do objeto, a mão parece pedir licença para os olhos pois assim, poderá ver/sentir a textura, temperatura, formato, consistência e deslocamento deste. A visão integra informação em compatibilidade e coerência com o corpo total, com o sistema tátil e proprioceptivo, para só depois a interpretação da imagem visual ser de fato operada. Enquanto a criança vê, por exemplo uma bola, paralelamente também a toca e recebe outras informações, inclusive auditivas, podendo processar verdadeiramente o que viu e concluir: “certo, o que eu vejo é uma bola! Ela é redonda, macia, leve, eu posso agarrá-la, eu posso chutá-la!”
Integração Sensorial é um processo neurobiológico complexo que envolve várias estruturas do sistema nervoso, são elas: a medula espinhal, tronco encefálico, hipotálamo, tálamo, cerebelo, sistema límbico, gânglios basais e córtex.

• A medula é um veículo condutor de impulsos nervosos que recebe e realiza processamento inicial dos neurônios sensitivos da pele, articulações e musculatura de membros e tronco, controlando seus movimentos;
• o tronco encefálico com o hipotálamo é responsável pela função vegetativa, endócrina e visceral; possui um rede difusa de neurônios chamada Formação Reticular que filtra a informação sensorial, alerta os centros superiores que informação relevante está chegando, contribui para a vigília, orientação e atenção;
• o tálamo é responsável por organizar as informações sensoriais e distribuí-las para as próximas estruturas neurais de processamento;
• o cerebelo recebe impulsos sensitivos de articulações, músculos, tendões, olhos e órgãos de equilíbrio, sendo assim responsável pelos reflexos e pela coordenação dos movimentos, além de atuar no tônus muscular regulando o grau de contração do músculo para manutenção da postura e do equilíbrio do corpo, graças às suas ligações com os canais semicirculares do ouvido interno;
• o sistema límbico tem relação com a memória, a emoção, olfato e o sistema visceral;
• os gânglios da base tem relação com os aspectos cognitivos do movimento, como planejar e executar atos motores complexos;
• o córtex é uma camada fina, mais externa do cérebro, formada pela substância cinzenta, responsável pelo processamento mais sofisticado e distinto. É dividido em áreas para a interpretação de informações específicas que estão envolvidas com movimento voluntário, percepção, linguagem e julgamento.

SISTEMA TÁTIL:

Os receptores sensoriais (neurônios sensitivos primários) deste sistema estão presentes na pele com distribuição em níveis diferentes pelo corpo. Eles irão detectar os estímulos na parte mais superficial ou profunda da pele e conduzi-los para o sistema nervoso.

Figura 1 - Sistema tátil.

As Terminações Nervosas Livres captam estímulos dolorosos, danos no tecido e temperatura.
Os Discos de Merkel são sensíveis à distorções da pele, detecção de borda, toque e pressão. Os Corpúsculos de Meissner detectam textura, vibração e toque leve. O Bulbo de Krause detecta frio. Os Corpúsculos de Ruffini detectam o calor, pressão e ou longamento
da pele e os de Paccini pressão e vibração de alta frequência.

Após detectar os estímulos, estes neurônios os conduzem ao sistema nervoso central através de duas importantes vias: Via Espinotalâmica Anterolateral que irá processar informações de dor, temperatura, toque leve e sensações difusas.
Via da Coluna Dorsal do Leminisco Medial: relacionado à discriminação tátil, vibração, toque profundo, propriocepção, aspectos temporais e espaciais do estímulo, influenciando a práxis e o controle motor fino. Temos ainda uma outra via denominada Trigeminal que capta a sensibilidade geral somática da cabeça detectando impulsos de temperatura, dor, pressão na face, na conjuntiva ocular, na parte ectodérmica da mucosa bucal, do nariz e seios paranasais, nos dentes, nos 2/3 anteriores da língua, na maior parte da dura-máter craniana, no pavilhão auditivo e no meato acústico externo.
Uma das funções mais importantes do tato é nos proteger do perigo. O tato nos ajuda a distinguir o toque de um amigo ou de um inseto que acaba de pousar em nossas costas. Outra função é a discriminação dos objetos nas mãos para manejá-los com destreza.

Figura 3 - Sistema coluna dorsal
Figura 3 - Sistema coluna dorsal

Guia T21

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2 respostas a “Integração sensorial e a criança com Síndrome de Down (T21) – Parte 1”

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