POR ANDREIA TORRES, PHD

Nasceu no Rio de Janeiro mas cresceu em Brasília, cidade onde estudou. No departamento de nutrição na Universidade de Brasília formou-se e também concluiu o mestrado. Fez o doutorado no instituto de psicologia e pós-doutorado no departamento de saúde coletiva. Atualmente trabalha em Portugal como coordenadora científica da empresa VP Centro de Nutrição Funcional.

Tabela 1 – Genes superexpressos na síndrome de Down (T21)

O CASO DA SÍNDROME DE DOWN (T21)
Na síndrome de Down (T21) a presença de 3 cromossomos 21 cria uma situação diferenciada. Apesar de o cromossomo 21 ser pequeno, contendo apenas de 1 a 1,5% dos genes humanos1, algumas de suas informações regulam a expressão de genes presentes em outros cromossomos.
Ademais, genes presentes na região crítica do cromossomo 21 estão superexpressos, incluindo APP, SOD1 e DYRK1A (Tabela 1), aumentando o risco de determinadas condições de saúde.

Tabela 2 – Papel epigenético de nutrientes selecionados

Pesquisas recentes buscam compreender como silenciar genes, que se encontram superexpressos, por meio de compostos ou nutrientes selecionados. A nutrigenômica é uma ciência emergente que estuda como nutrientes e compostos bioativos influenciam o estado de saúde e doença por meio da modulação da expressão gênica. Dentre os mecanismos epigenéticos destacam-se a metilação, a modificação de histonas e o silenciamento de micro RNAs.
O termo metilação refere-se à adição de um grupo metil (CH3) na posição 5’ da citosina na molécula de DNA, na região promotora do gene. Os nutrientes que participam
da metilação do DNA atuam em conjunto, como piridoxina (B6), folato (B9), colina, cobalamina (B12) e metionina (Tabela 2).

Outro foco da nutrigenômica são os polimorfismos ou variações na sequência de DNA. Um polimorfismo comum na síndrome de Down (T21) é a do gene metilenotetrahidrofolato redutase (MTHFR). Esta variante faz com que a eficiência de conversão do folato (vitamina B9 inativa) em metilfolato (vitamina B9 ativa) seja mais baixa (Figura 3). Isto resulta em menor capacidade de formação de S-adenosil-metionina (SAME) para manutenção da metilação do DNA e para o controle da expressão genética6.

Figura 3 – Ciclo da metionina

Existem evidências de que alguns genes encontram-se hipometilados em pessoas com síndrome de Down (T21), o que contribui para o envelhecimento precoce e o risco aumentado de doença de Alzheimer7. Como os nutrientes afetam a expressão gênica, recomenda-se que pessoas com polimorfismos do gene MTHFR sejam suplementadas com ácido folínico e/ou metil-folato. A suplementação adequada mantém níveis ótimos de homocisteína, SAME e Glutationa (GSH)8. Concentrações aumentadas de homocisteína9 e baixas concentrações de SAME10 e glutationa11 associam-se a maior risco de doença de Alzheimer.
O desafio é compreender que nutrientes e quantidades seriam ideais para cada pessoa, metilando genes quando há necessidade, sem, por outro lado, incorrer em hipermetilação, o que poderia acarretar em novos problemas de saúde. Outro foco de pesquisa é o da suplementação de fitoquímicos, compostos produzidos por plantas. Tais compostos parecem proteger o DNA, reduzir o estresse oxidativo, modular a expressão genética12, suprimir a neuroinflamação, melhorar a memória e o comportamento13.
Plantas que produzem polifenóis (moléculas com anéis aromáticos ligados por um grupo hidroxila), como ácidos fenólicos, estilbenóides e flavonóides parecem reduzir a agregação de proteína beta-amilóide no cérebro, melhorar memória e comportamento. Dentre os compostos atualmente estudados destacam-se o ácido rosmarínico do alecrim14, a curcumina do açafrão15, a epigalocatequina galato do chá verde16 e o ácido elágico da romã17.
Os resultados são promissores. Contudo, pesquisas com maior número de participantes são necessárias para confirmar os efeitos a longo prazo do uso de fitoquímicos isolados ou de forma combinada na saúde e qualidade de vida de pessoas com síndrome de Down (T21).

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente não existem terapias farmacológicas eficientes para a correção metabólica e prevenção de importantes problemas de saúde em pessoas com síndrome de Down (T21), incluindo a doença de Alzheimer. Dietas que forneçam quantidades adequadas de vitaminas do complexo B são fundamentais. Pessoas com polimorfismos de MTHFR também precisam receber suplementação adequada.
Recentemente fitoquímicos também começaram a ser estudados. Os mesmos estão presentes amplamente no reino vegetal e pesquisas sugerem que o consumo de alimentos e suplementos com quantidades variadas destes compostos pode atenuar processos neuropatológicos comuns neste grupo. Contudo, a maior parte dos estudos ainda são realizados em animais ou encontram-se em fases iniciais de investigação em humanos.
Dado que a doença de Alzheimer é uma condição progressiva, que afeta a qualidade de vida e atinge uma alta proporção de pessoas com síndrome de Down (T21) mais estudos são necessários para que recomendações possam ser feitas com segurança. Em termos de saúde pública, como fitoquímicos com propriedades protetoras estão presentes em altas quantidades em frutas, verduras, sementes, ervas e especiarias, recomenda-se uma dieta variada baseada em alimentos naturais, com a menor quantidade possível de produtos processados e ultraprocessados.

REFERÊNCIAS
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