POR DRA. ELISABETE CARRARA DE ANGELIS*

Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana e Doutora em Neurociências (Unifesp-EPM). Especialista em Voz e em Motricidade Orofacial. Diretora do Departamento de Fonoaudiologia do A. C. Camargo Cancer Center.

Princípios

Atualmente já existe um consenso na comunidade científica e clínica internacional sobre os princípios que devem guiar a terapia de fala e linguagem para uma criança com síndrome de Down (T21), baseados nas pesquisas sobre suas dificuldades e em intervenções efetivas (Stoel-Gammon, 2001). A literatura recomenda a necessidade de separar alvos para os quatro componentes das habilidades de fala e linguagem – comunicação, vocabulário, gramática e fala, para cada criança ((Buckley & Prèvost, 2002).
Nas áreas de vocabulário e gramática, os alvos também devem ser separados para compreensão e produção (Chapman & Heskett, 2001).
Atualmente é consenso tanto o valor do uso de gestos e sistemas de sinais para promover a linguagem falada quanto a utilização de atividades de leitura com benefícios tanto para a compreensão quanto para a produção da fala, mesmo em crianças pré-escolares.
Apesar do perfil acima apresentado das características de fala e linguagem de crianças com síndrome de Down (T21), cada indivíduo é único e toda a reabilitação deve estar embasada numa avaliação minuciosa de todas as áreas envolvidas na aquisição e desenvolvimento de linguagem, incluindo histórico médico e de saúde geral.
Os componentes de uma avaliação fonoaudiológica devem abranger uma entrevista detalhada, a
avaliação do mecanismo oral, um screening auditivo e devidos encaminhamentos para avaliação audiológica, se não realizada até o momento, a avaliação dos sons da fala e a avaliação da linguagem e da alfabetização, se indicada.
A partir disto, um planejamento terapêutico deve ser realizado levando-se em consideração as
prioridades específicas individuais, incluindo linguagem receptiva e expressiva, semântica (vocabulário),
sintaxe (gramática), pragmática, fala, planejamento motor oral, e motricidade oral.

Intervenção Precoce

Os primeiros anos de vida são um período crítico no desenvolvimento de uma criança. São nestes
anos que as crianças atingem habilidades básicas físicas, cognitivas, sociais e de linguagem que serão a base para o progresso futuro. As crianças com síndrome de Down (T21) tipicamente apresentam atrasos em certas áreas do desenvolvimento, de forma que a estimulação precoce é altamente recomendada.
Pode iniciar a qualquer momento após o nascimento, mas a princípio, o quanto antes, melhor!
Segundo a National Down Syndrome Society, a estimulação precoce de linguagem é o termo dado
para os serviços oferecidos a crianças do nascimento aos dois anos de idade, integrando um planejamento terapêutico global, incluindo fisioterapia, terapia ocupacional e outros profissionais trabalhando com a família.
A estimulação precoce na fonoaudiologia deve envolver a estimulação de sons, estimulação de linguagem acompanhando as brincadeiras, orientações para a alimentação, massagens intra e extra-orais e exercícios oromotores. Deve sempre incluir a família como parceiros do tratamento.

Estimulação em casa 

Os pais são os principais “comunicadores” interagindo com seus bebês e crianças e, portanto,
são os grandes responsáveis para ajudar a criança a aprender a se comunicar. A linguagem é aprendida todo dia, o dia inteiro, à medida que a criança se relaciona com seus familiares e amigos. Assim, o foco de uma terapia efetiva deve ser compartilhado com os pais. Muitas das habilidades pré-linguísticas são mais bem aprendidas no ambiente do lar.
A National Down Syndrome Society recomenda algumas ações aos pais:

– lembrar que a linguagem é mais do que palavras faladas. Quando ensinando uma palavra ou um
conceito, foque primeiramente na transmissão do significado para a criança através da brincadeira ou de experiências multissensoriais;
– oferecer vários modelos. A maior parte das crianças com síndrome de Down (T21) necessita de
repetições e experiências até apreender uma palavra. Os adultos devem repetir o que a criança diz e
dar a ela o modelo para ajudá-la a reforçar a palavra;
– usar objetos concretos e situações reais. Quando ensinando um conceito, os pais devem usar atividades diárias o máximo possível. Podem ensinar nomes das comidas à medida que o bebê está comendo, nome das partes do corpo durante o banho, e conceitos como dentro, embaixo, sobre, enquanto a criança está brincando. A comunicação é parte da vida!
– ler para a criança!! A criança aprende conceitos através da leitura, passeios ao ar livre ou na vizinhança e experiências diárias. Limitar o uso de celulares e tablets;
– observar os interesses do filho. Se ele demonstra interesse em um objeto, pessoa ou evento, os
pais devem oferecer a palavra para aquele conceito.
Uma vez que a Apraxia de Fala é tão frequente na síndrome de Down (T21), a estimulação precoce,
a meu ver, deve também considerar atividades que estimulem o aprendizado motor dos sons da fala.
Por exemplo, ao brincar com a criança rolando uma bola, segure esta perto da boca, faça ela olhar para você e emita um som de uma vogal prolongada. Ao brincar de martelar pininhos, segure o martelo próximo da boca e emita “pa!” antes de realizar a ação.
À medida que a brincadeira avança e a criança se desenvolve, começar a pedir que ele também faça o som, estimular a imitação, estimular a produção dos sons!!
Para alguns pais, a estimulação da fala e da linguagem, de qualquer filho, ocorre de forma natural.
Não é necessário pensar ou ser orientado para tal fim. Alguns pais, entretanto, por personalidade ou
por estarem confusos com a quantidade de novas informações que por vezes o nascimento de seu filho gerou, ficam inseguros quanto à “estimulação”.
Cabe ao fonoaudiólogo a observação e sensibilidade de identificar os pais que necessitam de maiores acolhimentos, orientações e demonstrações nesta área. Nem sempre o trabalho fonoaudiológico surtirá excelentes resultados em crianças com potenciais para isso, se pai/mãe/babá/avós estiverem calados, inseguros ou tristes.

Guia T21

Esse texto faz parte do nosso Guia sobre T21 que você pode baixar completo gratuitamente na versão digital.

Saiba mais

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *